março 25, 2008

nomes.
ela tinha vários nomes em seu caderninho. seu velho caderno de capa azul. azul da cor do mar que ela nunca vira.
nomes.
eram tantos. tantos passaram pela sua vida, pela sua cama. quantas vezes já passara por outras camas. cadeiras e sofás de tantos outros que lhe falhavam a memória. a idade chegava e a memória ia embora. a saúde também, maldito cigarro. mas do vinho ela não reclamava, apesar de tudo. bebia. bebia por tudo que tinha vivido e pelo tempo que não vem mais porque nunca haverá de existir.
nomes.
maldita mania de olhar esses nomes. lembrava bastante de três porque um levava ao outro que levava ao outro. que levava à cheiros e à luzes que piscavam num céu e num frio de uma noite qualquer. numa data qualquer. numa cidade qualquer. quantas foram as noites? quantas as cidades? dane-se.
apesar da idade, a beleza não ia junto com a memória. é pena que o mesmo não podia se dizer dos móveis. principalmente o velho tapete que ela não largava e daquela cômoda com os porta-retratos. dane-se. sempre fora desbocada, nunca mal educada. se queria mandar alguém a um lugar, pra depois da puta-que-pariu, fazia isso mentalmente. aprendera a fazer a maior parte das coisas mentalmente. sofria mentalmente.
sofria.
nenhuma ligação chorosa de madrugada. não. nem com o copo ela conversava. às vezes com o cigarro. mentalmente. ele a entendia sem a necessidade de saídas vocais. não.
ela tinha 40 anos e olhava para o porta-retratos que ficava mais atrás... era incrível como aquela casa era linda.
tinha 40 anos e várias cenas vinham ao mesmo tempo na cabeça. nessas horas ela não queria ter memória.
ela olhava fixamente a foto. o nome, dela, havia esquecido.
maldita memória.
nomes.
quantos seriam ao todo??
[números]